Filho de um crooner e uma corista, Ney Latorraca desde as fraldas já estava envolvido pela aura do meio
artístico, tanto que teve como padrinho de batismo ninguém menos que Grande Otelo. Seus pais trabalhavam em um cassino, e aos 2
anos depois do seu nascimento, um decreto presidente do Eurico
Gaspar Dutra fechou os cassinos, o
que fez a família perder sua única fonte
de renda.
Mas o gostinho pelo mundo das artes não
saiu de dentro do Ney, que começou cedo na carreira de ator. Aos 6
anos, fez uma participação em uma
radionovela na Record, depois
atuou no teatro estudantil e teve sua primeira oportunidade profissional
por volta dos 20 anos de idade, ao ser aprovado para integrar o elenco
de Reportagem
de um Tempo Mau, em 1965, que teve apenas uma apresentação no Teatro Arena, tendo sido proibida pela
Censura Federal.
Formou-se na Escola de Arte Dramática, antes desta passar a funcionar na Universidade de São Paulo. Entre seus
professores nomes como Ziembinsky e
Antunes Filho, e entre os colegas de classe
Jandira Martini, além de Marília Pêra como madrinha de
formatura.
Ingressou na Tv fazendo figuração.
Participou do seriado Alô Doçura (1953),
da novela BetoRockfeller (1968) e três capítulos da
trama de SuperPlá (1969), todas na Tupi. Depois fez uma passagem pela Tv Cultura, onde trabalhou em um
teleteatro, encenando Yerma.
Durante a década de 70, atuou em
diversas montagens teatrais, entre elas Hair (1970); Jesus Cristo Superstar (1972); Bodas de Sangue (1973),
O Rei Lear (1983) e em um dos maiores sucessos em montagens
teatral brasileira, O Mistério de Irmã Vap, que ficou em cartaz
por onze anos, onde contracenou com um
dos seus mais fiéis parceiros de cena, MarcoNanini.
No cinema participou de longas de
sucesso como Sedução
(1974); Anchieta,
José do Brasil (1976); O Beijo no
Asfalto (1981); Ele, O Boto (1986);
Carlota Joaquina
– Princesa do Brasil (1996); Irmã Vap – O Retorno
(2006) entre outras.
Considerado um dos mais versáteis e felinos atores da sua
geração, Ney Latorraca nunca teve
papas na língua e hoje está no status de um dos melhores atores brasileiros com
atuações simultâneas no
teatro, cinema e na Tv, este último o veículo onde imortalizou
personagens que nunca serão esquecidos na história da teledramaturgia nacional.
Mederiquis de EstúpidoCupido (1976)
Depois de alguns trabalhos na Rede Tupi e RecordTv, Ney estreou na Tv Globo na trama de Escalada (1975), do
autor Lauro César Muniz, mas conseguiu
sua projeção nacional ao dar vida
a Mederiquis, o rebelde sem causa e um dos protagonistas da trama de Estúpido Cupido,
do autor Mário Prata. O Ator foi um
dos grandes destaques. Logo no início da trama Ney não gostou do perfil criado
para o personagem, era muito maquiado e artificial. Ele chegou a pedir para
sair da novela mas foi convencido por Guta (Uma diretora da Globo), a voltar e
fazê-lo como achava que deveria ser. Ai
o Mederiquis foi o que foi, provando toda a genialidade do Ney, que mais do que
interpretar, cria a alma dos seus personagens e moldando
a seu jeito, sempre perfeito.
Marco de SemLenço, Sem Documento (1977)
No ano seguinte o ator ganha o protagonista do próximo
trabalho de Mário Prata, a novela Sem Lenço, Sem
Documento. Na pele do Marco, um escritor com uma série de problemas
acusado até de desonesto, vive romances dividido em as irmãs Carla e Berta,
as personagens vivida pela BrunaLombardi e Maria Helena Berenger.
Jonas de ChegaMais (1980)
Em Chega
Mais, do Carlos Eduardo Novaes, Ney
Latorraca participou dos primeiros capítulos da trama dando vida ao Jonas,
o segundo marido de Lúcia, a personagem da Renata Sorrah.
Leandro Serrano de Coração Alado (1980)
Em 1980, Ney Latorraca deu vida ao grande vilão de Coração Alado, da autora Janete Clair. Executivo das empresas de
Alberto Karany (Walmor Chagas), no início da trama é noivo de Melissa (Joana
Fomm), com quem casa-se no decorrer da novela. Na trama o ator protagoniza uma
das cenas mais marcantes e polêmicas de Coração Alado ao
estuprar Vivian, a protagonista vivida pela Vera Fischer. O Ator contou em seu livro que foi uma cena difícil,
que mesmo si tratando de uma das piores violência cometidas a uma mulher, tinha
que ser mostrada de forma deliciada para não chocar o público. Mesmo com toda
essa delicadeza a cena deu um susto no
público e a crítica caiu de críticas em cima da trama, alegando que era uma
cena muito forte para ser retratada na Tv.
Ernesto Gattai de Anarquistas Graças a Deus (1984)
Em Anarquistas, Graças a Deus, minissérie do autor Walter George Durst, baseado no romance
homônimo de Zélia Gattai, Ney Latorraca
deu vida a Ernesto Gattai, pai da
autora, e brilhou em uma das mais primorosas produções da Globo até então. Ney foi homenageado pela autora através de um
telegrama, contando que se emocionou em muitos momentos ao ver na figura do Ney
a imagem do seu saudoso pai.
Queque de Rabo de Saia (1984)
Ainda no mesmo ano de 1984, Ney Latorraca voltou como protagonista
de outra minissérie também do autor Walter George Durst, dando vida ao caixeiro
viajante Quequé de Rabo de Saia, baseada no conto Pensão Riso da
Noite, do José Condé. Ney
Latorraca foi aclamado pela crítica ao dar vida ao mulherengo personagem.
Inicialmente escalado para um papel secundário, foi o próprio autor que pediu
ao diretor Walter Avancini para
viver o Quequé. O Diretor relutou, pois tinha como imagem para o Quequé um ator
mais viril para representa-lo, mas foi rendido pelas súplicas do Ney e o Brasil
se apaixonou e se emocionou com seu Quequé e suas aventuras. E mesmo mantendo um caso extraconjugal com
três mulheres ao mesmo tempo, foi
perdoado pelo grande público corando a minissérie como a melhor produção do ano
pela APCA (Associação Paulista de
Críticos de Arte).
Escadinha de Partido
Alto (1984)
Em Partido Alto, do Aguinaldo Silva e Glória Perez, o ator fez uma participação marcante no primeiro
capítulo dando vida ao marginal Escadinha, ex-marido de Jussara (Betty Faria) e
irmão de Piscina (José Mayer). Foi o terceiro personagem do Ney no ano de 1984
na teledramaturgia.
Volpone de Um Sonho a Mais
(1985)
Em 1985,
na trama de Um Sonho a Mais, do autor Daniel Más, Ney
Latorraca deu vida a um dos personagens
mais famosos da história da teledramaturgia nacional. O milionário excêntrico
Volpone marcou o ano de 1985 e transformou Ney em um dos principais nomes do
casting global. Além do Volpone, o ator viveu outros quatro personagens que
eram disfarces que ele usava para tentar descobrir quem cometera o crime que fora acusado no passado. Os disfarces eram o
médico Nilo Peixe , o advogado Augusto Mello Sampaio, André, um motorista
escrachado que vivia sempre de braguilha aberta e palito na boca e a que mais
teve destaque na trama, Anabela Freire, uma secretária sedutora, dona de pernas
deslumbrantes e um sorriso de coelhinha, marcado por um dente saliente. O Sucesso da personagem com Ney travestido de mulher chocou a censura
que não perdoou e exigiu que os
travestidos fosse suplantados na trama. Além de Ney vestido de Anabela, Marco Nanini e Antônio Pedro também
faziam personagens travestidos, Florisbela e Clarabela, as irmãs de Anabela. O
Autor tirou de cenas as irmãs de Anabella, mas ela continuou lá, tímida mas
operante. Foi na trama de Um Somho a Mais que
aconteceu o primeiro beijo entre homens da história da Tv, na verdade um
selinho entre Ney e Carlos Kroeber,
no casamento de Anabella com Pedro Ernesto, o personagem do Kroeber.
Conde Vlad de Vamp(1991)
Seis anos depois do Volpone, em 1991, Ney Latorraca voltou a interpretar em
novelas um personagem que se transformou instantaneamente em sucesso popular. Mesmo
sendo o vilão de Vamp, o Vlad virou uma espécie de marca registrada da
novela e outro personagem
imortalizado na nossa teledramaturgia. O ator contou em sua biografia “Muito Além do
Scrifit” que Antônio Calmon queria um conde soturno
com ares de galã para o perfil do Vlad,
mas logo nas primeiras cenas gravadas Ney deu seu pessoal toque ao personagem. Jorge Fernando gravava a sequência em que Vlad morde Natasha
(Cláudia Ohana) e diria : “Gostoso”. Ney trocou o “Gostoso” sensual por um hilário “Gotoso!
Gotoso Mesmo!”. Pronto, naquele
momento o vilão com um inconfundível censo de humor caiu no gosto do público e o personagem
estourou! A Chanchada de terror na qual
a trama foi se transformando no decorrer dos capítulos chegou ao seu ápice
quando Ney Latorraca dançou a
coreografia mórbida que lembrava o sucesso “Thriller” do Michel Jackson
entre os zumbis do cemitério de Armação dos Anjos.
Cornélio de O Cravo e a Rosa (2000)
Em 2000, Ney Latorraca protagonizou
junto com Maria Padilha uma
das dobradinhas que foram destaque na trama de O Cravo e a Rosa, do autor Walcyr Carrasco. Cornélio,
seu personagem, era o obediente marido de Dinorá, a personagem da
Padilha, submete-se a tudo o que a mulher quer. Engraçado, tímido, cordeirinho,
que morre de medo da esposa. Ao descobrir as várias puladas de cerca dela, vai à
forra e começa um envolvimento com Dalva, a personagem da Bia Nunnes.
Nosferatu de O Beijo do Vampiro (2002)
Em 2002, a Globo encomendou à Antônio
Calmon uma trama com a temática vampiresca mas que não fosse uma Vamp 2.
Para evitar a semelhança foi trocado até o diretor, Jorge Fernando pelo saudoso MarcosPaulo, e a produção foi a aconselhada a não escalar nenhum ator que tivesse
feito Vamp.
Assim foi. Porém na metade da trama, a regra foi quebrada e Ney Latorraca
voltou a viver um vampiro do mal. Nosferatu apesar do dose cômica, era muito
diferente do Vlad, mas fez tanto sucesso quanto junto ao público.
Dr. Solano de SOS
Emergência (2010)
Em 2010, Ney Latorraca deu show de humor dentro de um hospital na pele do
Dr. Solano no seriado SOS Emergência,
dos autores Marcius Melhem e Daniel Adjafre. O personagem era o
chefe de uma equipe hospitalar que fazia
loucuras para curar seus personagens. O Ney mais uma vez dava seu toque
pessoal ao personagem, e brilhou em dobradinhas inesquecíveis com a veterana
Marisa Orth e a quase estreante Ellen Rocche.
Barbosa do Tv
Pirata (1988 e 1989)
Mesmo com tantos personagens marcantes
nas novelas, sem dúvidas o personagem do Ney que o público lembra quase que imediatamente
é do velhinho Barbosa do humorístico Tv Pirata,
que o ator encarnou entre os anos de 1988 e 1989, no programa que virou marco
na história da Rede Globo. O Barbosa
era o pai de Natália (Déborah Bloch) dentro da novela Fogo no Rabo, uma sátira do programa
à novela Roda deFogo exibida anos antes. Caquético,
de cabeça branca e barrigudo, não conseguia comandar a família, e só sabia
repetir a última palavra de tudo que os outros diziam com um beicinho inconfundível
que virou mania nacional e um dos grandes sucessos do humorístico. Com o
término da novela, o sucesso do personagem lhe rendeu o programa “Barbosa Nove e Meia”, uma sátira aos
programas de entrevistas da época.
Fonte:
Texto:
Evaldiano de Sousa
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