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Enquete e10blog - Melhores do Ano

Balanço da Década - Anos 2010 – Novelas das 11


        Após duas décadas ocupando a faixa das 11 horas da noite com minisséries, seriados, séries e outros programas, foi exatamente na década passada que a Globo resolveu ressuscitar as novelas para este horário com o elogiadíssimo remake de O Astro em 2011. O sucesso  do remake  do Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro, baseada no clássico original da Janete Clair, exibido na Globo em 1977, motivou a manutenção do  quarto horário de novelas da emissora  com uma trama anualmente até 2018.
        Na apresentação de algumas delas, as produções foram designadas de  “Superséries” devido a sutis diferenças se comparadas as novelas “ditas normais” dos outros  horários – não tinham reapresentação do último capítulo, nem foram  lançadas comercialmente suas trilhas sonoras, além de terem um número bem menor de capítulos, mas o costume brasileiro não adotou o subtítulo e as tramas são sim “telenovelas” indiscutivelmente.



        Como já disse O Astro, do Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro, inaugurou o horário em 2011 com maestria numa adaptação primorosa  da famosa novela de Janete Clair. A produção comemorava os 60 anos da Telenovela Brasileira – a primeira, Sua Vida Me Pertence, estreou na TV Tupi em dezembro de 1951.  O estilo kitsch, exagerado, melodramático, em texto, interpretações e caracterizações, mostrou ter sido uma opção acertada. O tom popularesco da trama (que muitas vezes beirou o estilo mexicano de teledramaturgia), com referências à cultura pop e erudita, foi a tônica do texto afiado dos autores. Não faltou violência, cenas de sexo e situações politicamente incorretas, com cenas de personagens fumando, bebendo e jogando. Em um horário com uma classificação indicativa mais permissiva, pôde-se voltar a abordar temas e situações que estavam banidos de outros horários.  Um elenco de primeira em uma direção primorosa, com destaque para Rodrigo Lombardi (Herculano),  MarcoRicca (Samir), Humberto Martins (Neco), Rosamaria Murtinho (Magda), Fernanda Rodrigues (Jôse) e Antônio Calloni (Natal). E em especial Regina Duarte – com sua Clô Hayalla -, que há tempo não tinha em novelas uma interpretação tão marcante. Francisco Cuoco,  imortalizado como o astro Herculano Quintanilha da primeira versão, participou nesta adaptação, como Ferragus, o mentor do Herculano atual (Rodrigo Lombardi).  O Astro foi a vencedora do Emmy Internacional (prêmio norte-americano) de melhor novela de 2011.



        Em 2012, a Globo produziu com grande alarde o remake de Gabriela, agora reescrito por Walcyr Carrasco. A grande dúvida dessa produção era escolher a atriz que reviveria a personagem imortalizada pela beleza e interpretação de Sônia Braga na primeira versão.  Mesmo com muitas críticas à sua escolha, Juliana Paes foi eleita a Gabriela dos anos 2000, e  logo  nas primeiras cenas ficou nítida a escolha acertada. Juliana Paes imortalizou uma nova Gabriela e hoje temos duas  que fazem parte da  história da teledramaturgia nacional.  Walcyr Carrasco, o adaptador, imprimiu à novela suas marcas registradas: diálogos ferinos e espirituosos, frases no imperativo, personagens caricatos em situações cômicas (camas quebradas, tortas na cara, etc). Até um bichinho de estimação Carrasco arrumou para Gabriela. Enfim foi uma Gabriela Carrasquiano mais que fez bonito no horário embora tenha ficado muito aquém do sucesso de O Astro (2011). 


        Os remakes continuaram ser produzidos no horário e em 2013  veio a nova versão de Saramandaia, clássica novela do Dias Gomes,  produzida pela Globo em 1976.  Saramandaia abusou do direito de criticar e usando de metáforas deu uma tapa na cara do Brasil mexendo em assuntos polêmicos e tabus de uma maneira pertinente. Aliás, as críticas sociais em forma de metáforas  foram o grande destaque da novela, que chamou mais atenção do que o folhetim propriamente dito.



        Em 2014,  veio  o remake de O Rebu, do George Moura e Sérgio Goldenberg, baseada no original de Bráulio Pedroso, apresentada na Globo em 1974,  Infelizmente tal qual, o que acontecera na versão de 1974,  acabou sendo incompreendida por causa da sua narrativa. Em 1974, era até compreensivo, afinal de contas era uma inovação, mas nos dias de hoje onde praticamente todos os seriados americanos usam esse mecanismo dos acontecimentos fora da ordem linear. A ação, como no original, se passava em três tempos: a festa, o dia seguinte, com a investigação, e flashbacks mostrando o passado de cada personagem e suas possíveis motivações para matar.
 No elenco destaque absoluto para Patrícia Pillar, que foi simplesmente perfeita  na pele da Angela Mahler. Mas o elenco feminino de O Rebu não deixou a desejar. Vale citar nesta lista Cássia Kiss Magro (claro!) , Vera Holtz,  Dira Paes , Maria Mariana e Camila Morgado. Mesmo com uma audiência sofrível, não podemos tirar os méritos de O Rebu. Uma trama luxuosa e sofisticada, produção e direção impecável do José Luiz Vilamarim  fizeram  com que a trama  não perdesse o  fôlego ao longo dos 36 capítulos.   



        Em 2015, o horário deixou os remakes de lado e apresentou a primeira novela inédita – Verdades Secretas – do Walcyr Carrasco.  O público vibrou com uma premissa pouco coerente, mas ousada: o homem que se casa com uma mulher apenas para ser amante da filha dela com o  submundo da moda servindo  como pano de fundo. A novela discutiu drogas e prostituição de luxo – o chamado “book rosa”.          Os nudes e vários outros momentos da novela entraram para hall das grandes cenas da teledramaturgia nacional. A Cena da Carolina (Drica Moraes) morta com a Angel (Camila Queiroz)  chorando ao seu lado pode ser considerada a marca do capítulo final.      
  A nudez contextual de  Verdades Secretas não chocou o telespectador como se pensava, e mesmo sem a nudez frontal esperada das atrizes, o autor abusou desse artifício. Neste campo vale destacar a bunda do Rodrigo Lombardi, que surpreendentemente conseguiu ofuscar o da Paolla Oliveira, que virou  o assunto mais comentado no início do ano quando a atriz foi a estrela da minissérie Felizes para Sempre.
              O Elenco de Verdades Secretas sem dúvidas foi o grande trunfo da trama.  O que dizer da  Grazzi Massafera, que deu um show  numa interpretação visceral da drogada Larissa, um divisor de águas em sua carreira.        Destaque absoluto para a novata Camila Queiroz, que seduziu com beleza e talento o Brasil na pele da Angel e fechou a novela com chave de ouro com a emocionante  cena do desespero ante a morte da mãe.       A novela foi muito aguardada por trazer em seu elenco duas atrizes que estavam  afastadas  das novelas : MarietaSevero, que há 13 anos estava vivendo a Dona Nenê de A Grande Família; e Drica Moraes, que voltava às novelas depois do afastamento repentino na trama de Império (2014). E o retorno de ambas não poderia ter sido em uma produção melhor.
             A Direção de Verdades Secretas ficou a cargo do Mauro Mendonça Filho, que dispensa  apresentações,  fechando o  terceiro trabalho  do diretor com o Walcyr Carrasco. Muitas cenas  simples da trama tomaram uma proporção até inesperada devido essa direção cirúrgica do Mauro que sabe como ninguém dirigir atores, lhes tirando o melhor. 
        Em um momento em que a teledramaturgia global vinha  sofrendo com rejeições,  o sucesso de Verdades Secretas foi um suspiro aliviado da emissora. Muito além de  uma novela  dosada com nudez,  ela  foi marcada por um texto lapidado por uma direção primorosa e atuações inesquecíveis, não à toa  foi a vencedora do Emmy Internacional (prêmio norte-americano de televisão) de melhor novela de 2015.



        Liberdade, Liberdade (2016) vinha sendo  escrita por Márcia Prates – que já trabalhou com Aguinaldo Silva, João Emanuel Carneiro, Walther Negrão e outros – a partir do livro Joaquina, Filha do Tiradentes, de Maria José de Queiroz. Esta seria sua primeira novela solo.
Mas a direção da Globo, insatisfeita com a qualidade artística e histórica do roteiro, afastou a novelista e a substituiu por Mário Teixeira, que reescreveu os primeiros capítulos e assumiu a autoria da produção.  Uma história ficcional embasada em fatos e personagens reais. Boa parte dos personagens é fictícia, inclusive a protagonista Joaquina na fase adulta (vivida por Andreia Horta), filha de Tiradentes, já que só existem registros
dela até a adolescência.
            Tendo que contar a história principal da novela praticamente em sua última semana, o autor teve que se desfazer de personagens e resolver as tramas paralelas antes dessa última semana e assim perdemos mais cenas do Dalton Vigh como o  Roposo Viegas, um dos protagonistas morto no meio da novela, e a NathaliaDill que esteve espetacular na pele da louca Branca Farto.
              A novela também ficou marcada pelo ineditismo da apresentação da primeira transa entre dois homens na teledramaturgia nacional. A cena causou polêmica antes mesmo da estreia da novela e muita gente não acreditou que a Globo fosse capaz de leva-la ao ar. Mas o público foi surpreendido  e a  teledramaturgia brindada por uma das cenas mais emblemáticas da trama mostrando todo o tesão,  e porque não o amor,  que nasceu entre os personagens de Caio Blat e Ricardo Pereira.
        Mateus Solano, que sabe como poucos marcar um personagem. Depois de Félix de Amor à Vida (2013) e o Zé Bonitinho da nova versão da Escolinha do Professor Raimundo (2015), fez do Rubião outro grande personagem para o seu currículo.      E não tem como não  elogiar atuações da Andreia Horta, nossa eterna Joaquina; Maitê Proença, que na pele da Dionísia, viveu várias nuances  até chegar o final em dupla perfeita com o bandoleiro Mão de Luva, numa interpretação impecável do Marco Ricca.          As tramas paralelas criadas para segurar a história da filha de Tiradentes para a reta final tiveram  seu charme e acrescentaram muito à trama, como o romance do André e Tolentino, as loucuras de Branca Farto, a dupla Duque de Ega (Gabriel BragaNunes) e Alexandra (Juliana Carneiro da Cunha) que pretendiam dar um golpe na coroa e  a participação luxuosa da Princesa Carlota Joaquina (Suzana Ribeiro), tudo providencial e que se tornaram essencial para o desenrolar dos acontecimentos.  A história principal da Joaquina pode até ter sido prejudicada pela demora em se tornar realmente principal, mas em nenhum momento essas tramas paralelas  foram apenas meras “barrigas” para o desfecho final. Elas foram escritas de forma tão natural e acopladas ao texto, que acabaram ganhando vida própria  e merecido destaque.



        Os Dias Eram Assim foi a primeira novela a receber a designação de “supersérie”. O intuito era diferenciar essas produções das novelas exibidas nos tradicionais horários das seis, sete e nove da noite. E também pelo fato de sua produção não ser contínua (como as demais novelas), mas por acontecer uma vez por ano, geralmente no meio do ano.  Estreantes como autoras titulares, Ângela Chaves e Alessandra Poggi têm uma longa trajetória como roteiristas na Globo.      Mas o fato é que Os Dias Eram Assim flopou” mesmo tendo uma boa audiência, principalmente às quintas-feiras, impulsionada pela  A Força do Querer, fechou como a produção mais fraca , no sentido de audiência do horário das onze.
            Acho que o grande erro de Os Dias Eram Assim foi a demora de alguns acontecimentos que eram cruciais para o desenrolar da história. A primeira semana da supersérie  por exemplo,  poderia ter sido facilmente condensada em uma capítulo apenas. As autoras usaram duas semanas para apresentar o encontro da Alice com Renato (Renato Góes), sua fuga para o Chile e a prisão do Gustavo (Gabriel Leone), fatos que dariam o desenrolar da trama nas fases seguintes. Foi tempo demais. Isso sem falar no desperdício que foi o entrecho do reencontro entre Alice e Renato, quando ela ainda pensava que seu grande amor estava morto, faltaram os ganchos tão importantes para dar aquele gostinho de quero mais ao telespectador.
        Mas sem dúvidas o grande trunfo de Os Dias Eram Assim foi  a nostálgica trilha sonora utilizada como elemento de centralização de época da trama. Emocionou logo no tema de abertura, o clássico “Aos Nossos Filhos” da Elis Regina, regravado especialmente para a supersérie pelos protagonistas Sophie Charlotte, Renato Goes,Daniel de Oliveira, Maria Casadewall e Gabriel Leone.

        Passagens políticas que marcaram a história do Brasil como os anos de chumbo e luta pelas Diretas  foram retratadas com muita sensibilidade e credibilidade pela trama. O público  se emocionou ao  rever cenas reais da época das Diretas Já com políticos e  artistas que se jogaram de corpo e alma pela causa, entre eles Chico Buarque, Jô Soares, Osmar Santos e Christiane Torloni, na época eleita a musa do Diretas.
        Na Reta final destaque para a pertinente abordagem sobre a AIDS , que na década de 80 levou muita gente por pura falta de informação, e que nos dias de hoje apesar de não ser mais considerada mortal ainda é muito importante as informações sobre a doença  para uma conscientização.
        A Trama valeu pela pertinente revisão na história politica do Brasil,  desde os anos de chumbo até a política atual  com direito a um resumão emocionante em suas cenas finais.




            OndeNascem os Fortes  foi a última novela apresentada no horário.  Com uma história muito limitada para ser  contada em 53 capítulos,   talvez por isso os autores  George Moura e Sergio Goldenberg, tenham segurado os acontecimentos na trama  ao máximo para que não chegasse ao fim antes do final.
        Com isso o telespectador foi brindado com sequencias longas, com o brilho de grandes atores, como não víamos desde a teledramaturgia da década de 80 e 90 que primava por esse tipo de narrativa.  
        A fuga da Maria (Alice Weigmann) e sua procura pela identidade do assassino de seu irmão Nonato (Marco Pigossi) estendeu-se por quase dois terços da novela/supersérie,  o que cansou o telespectador e fez com que a minissérie esfriasse na audiência. Porém o telespectador mais fiel compreendeu a narrativa  e passou a enxergar a trama pela ótica da riqueza de detalhes, direção cirúrgica e interpretações fortes ,  o  que mostrou a preocupação da Globo em cada vez apresentar    melhor qualidade  em suas produções.
          Alice Weigmann foi visceral na pele da protagonista Maria. No elenco vale destacar o trabalho da Patrícia Pillar (Cássia), Alexandre Nero (Pedro), Déborah Bloch (Rosinete), Gabriel Leone (Hermano), Irandhir Santos (Samir), Enrique Dias (Plínio), Lee Taylor (Simplício), Maeve Jinkings(Joana), Carla Salle (Valquíria), Lara Tremouroux (Aurora), José Dumont (Tião das Cacimbas), Clarissa Pinheiro (Gilvânia)  e Titina Medeiros (Bethânia).
        Fábio Assumpção e Jesuíta Barbosa mereceram  um parágrafo a parte. Seus personagens,  Ramiro e Ramirinho, pai e filho, foram os que tiveram as cenas mais complexas e transformadoras da trama. Fábio  numa interpretação madura, saiu do seu lugar comum, de galã ou vilão galã para dar vida ao austero e asqueroso “coronel do sertão”. Jesuíta,    além de viver o filho reprimido,  por não poder revelar sua  identidade sexual,   ainda brilhou com a performática Shakira do Sertão, mostrando toda a sua sensibilidade cênica.
            Onde Nascem os Fortes pode não ter agradado ao grande público, mas é indiscutível sua qualidade técnica que somada ao talento dos envolvidos fizeram da supersérie um produto rico emoldurado com as paisagens secas do sertão nordestino em pleno século 21.

Texto: Evaldiano de Sousa 

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